Solidão criativa
Cynthia de Almeida -
jornalista
"A
imagem da felicidade na mídia é sempre representada por grupos. No
mínimo em duplas, se o clima for de romance. Turmas sorridentes que
conversam, se movimentam e dançam são cenas alegres, desejáveis,
em contraponto ao retrato de um indivíduo solitário, seja lá o que
estiver fazendo. O isolamento não é popular na nossa cultura. E,
desde que, há algumas décadas, definiu-se que o ser humano era,
além de mais feliz, mais criativo e produtivo em grupos, estudar e
trabalhar virou atividade coletiva. O brainstorming, a chuva
de ideias ou toró de palpites, tornou-se o modelo de inspiração
corporativa do século 20 para solucionar, inovar, criar e chegar ao
melhor resultado. Os escritórios, estúdios, agências, redações
derrubaram suas paredes, e até mesmo os cubículos acanhados dos
anos 1980 se desmonstaram em espaços livres, onde todos se escutam,
se veem e se comunicam com facilidade.
O mundo
estabeleceu esse modelo bem antes de a internet chegar e ser de fato
o lugar sem paredes para ampliar nosso potencial criativo por meio do
contato virtual com milhares de outros cérebros. No multiconectado
século 21, no entanto, o que vemos em estudos recentes é: estar só,
trabalhar em silêncio e com privacidade pode ser melhor, mais
criativo e eficiente do que em grupo. A consultora americana Susan
Cain, autora do livro Quiet, The Power of Introverts in a World
That Can't Stop Talking (Quieto, o poder da introversão em um
mundo que não consegue parar de falar), defende a tese de que é
hora de valorizar a introversão e promover um equilíbrio de poder
entre aqueles que falam muito e rapidamente e os que se sentam no
fundo e pensam. Esse tipo de profissional, tachado de tímido e pouco
valorizado em ambientes que exigem que as pessoas se coloquem e
marqueteiem suas ideias antes que alguém o faça, é o que
normalmente não é ouvido durante as reuniões de brainstorming.
Estudos
no campo da neurociência analisam a eficiência da reunião criativa
e constatam que, além de intimidante para os introvertidos, ela gera
o efeito coletivo de mimetização. Quando pensamos diferente do
grupo, diz o neurocientista Gregory Berns, ativamos em nosso cérebro
a amígdala, órgão associado ao medo da rejeição. Permanecemos,
por pavor de sermos contestados, presos à ideia do grupo, que nem
sempre é a melhor. Outros estudiosos da neurociência, Nicholas
Kohn e Steven Smith, alertam para um efeito cognitivo dos debates em
grupo, onde tendemos a nos fixar em uma ideia e, a partir daí,
bloquear o raciocínio para outras.
O
terapeuta organizacional Adrian Furham defende que trabalhar em
brainstorming é uma insanidade e que, se a empresa tiver
pessoas talentosas e motivadas, elas devem ser encorajadas
a trabalhar sozinhas, em ambientes em que a criatividade e a
eficiência sejam prioridade.
A maior
parte dos artistas, dos nerds, cientistas - enfim, dos grandes
criadores - trabalha e pensa melhor isolada. Segundo o parceiro de
Steve Jobs, Steve Wosniak, os criativos vivem imersos na própria
cabeça. 'Trabalhe sozinho', aconselha o gênio por trás do gênio
da Apple."
Particularmente,
defendo a ideia de que as pessoas possam se expressar livremente. E
aí também entra a possibilidade de se trabalhar sozinho, se a
pessoa for mais produtiva assim. Alterno momentos em que estou imersa
na minha própria cabeça e momentos em que quero trocar minhas
conclusões com outro colega.
É
alentador saber que aqueles que gostam de trabalhar sozinhos -
que apreciam a solitude - estão sendo vistos de forma mais
positiva...
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